O pedido de uma recepcionista de Salvador para obter licença-maternidade por vínculo afetivo com um bebê reborn reacendeu discussões jurídicas sobre os limites da proteção trabalhista e a definição de maternidade no Brasil. A funcionária entrou com uma ação na Justiça do Trabalho após ser negado o benefício e relata ter sido alvo de escárnio por parte de colegas e superiores no ambiente profissional. O caso, inédito em seu teor, levanta a questão se o ordenamento jurídico está preparado para reconhecer relações de maternidade que não envolvem filhos biológicos ou adotivos, mas sim construções afetivas não convencionais.
O centro da controvérsia gira em torno do conceito de maternidade socioafetiva. A mulher afirma que assumiu plenamente o papel materno em relação ao bebê reborn, cuidando da boneca como se fosse um filho e desenvolvendo um laço emocional que, segundo ela, justifica a concessão da licença-maternidade. A petição inicial da ação argumenta que o ordenamento jurídico civil já reconhece a maternidade afetiva em diversos contextos, o que deveria se estender ao campo trabalhista como forma de proteção da dignidade feminina e do direito ao cuidado.
A licença-maternidade por bebê reborn é um tema que, até então, não possuía precedentes sólidos no Judiciário brasileiro. A solicitação provocou surpresa entre profissionais do direito e foi acompanhada de alegações da autora sobre assédio moral na empresa. Segundo ela, colegas de trabalho zombaram do pedido, dizendo que ela precisava de um psiquiatra e não de um benefício trabalhista. O pedido de rescisão indireta do contrato de trabalho e indenização por danos morais no valor de R$ 10 mil também faz parte da ação em curso.
A argumentação central da recepcionista é que negar a licença-maternidade por bebê reborn significa reduzir a maternidade apenas à função reprodutiva da mulher, ignorando os avanços científicos e jurídicos que envolvem o conceito de vínculo emocional. A autora defende que cuidar, proteger e estabelecer laços com um ser — mesmo que inanimado — pode ter efeitos psicológicos comparáveis aos da maternidade convencional. A ausência de um ser vivo, nesse sentido, não excluiria a realidade do afeto, que seria, por si só, merecedor de tutela.
Especialistas apontam que o caso da licença-maternidade por bebê reborn desafia os critérios objetivos tradicionalmente adotados pelo Direito do Trabalho. Embora o Direito Civil admita vínculos afetivos sem base biológica, como no reconhecimento de paternidade ou maternidade socioafetiva, a transposição desse entendimento para o direito trabalhista ainda encontra resistências. Isso porque o benefício da licença-maternidade está geralmente vinculado a situações concretas de nascimento, adoção ou guarda judicial, com implicações legais bem definidas.
Caso a Justiça aceite o pedido, a concessão da licença-maternidade por bebê reborn pode abrir precedentes para demandas semelhantes em outras regiões do país. Segundo a petição, caso a rescisão indireta seja acatada, a mulher terá direito a aviso prévio, saldo de salário, férias vencidas e proporcionais, 13º salário proporcional, liberação do FGTS com multa de 40% e guias para o seguro-desemprego. A autora é representada pelo advogado José Sinelmo Lima Menezes, que sustenta a tese de que a relação emocional estabelecida com o bebê reborn é legítima e digna de reconhecimento jurídico.
A licença-maternidade por bebê reborn também toca em temas delicados como saúde mental e discriminação no ambiente de trabalho. O caso mostra como a falta de compreensão sobre fenômenos emocionais complexos pode gerar preconceito, especialmente quando envolvem práticas não convencionais. A autora afirma que sofreu discriminação institucional e social por adotar uma forma diferente de exercer a maternidade, sendo tratada como incapaz ou ridícula por parte de seus colegas de trabalho e pela própria empresa.
Embora o caso da licença-maternidade por bebê reborn ainda não tenha uma decisão definitiva, ele já provoca reflexões importantes sobre os rumos do direito afetivo no Brasil. A tendência de expansão das formas de reconhecimento jurídico da parentalidade pode levar a uma reavaliação das normas trabalhistas vigentes. No entanto, especialistas alertam para os riscos de banalização de direitos caso não haja critérios claros para definir os limites desses novos vínculos jurídicos e afetivos.
Autor: Demidov Lorax